Papo de Política #93: resistências

Sou cordeiro' ou a sacraliza\u00e7\u00e3o da pol\u00edtica no Equador

No Equador,qual é a chance de ganhar na mega-sena a disputa pela Presidência come?ou após o decreto de dissolu??o recíproca em 17 de maio de 2023. A medida, emitida pelo presidente Guillermo Lasso, antecipa as elei??es para completar o período vigente do bin?mio presidencial e dos cargos legislativos.Para repetir seu sucesso nas elei??es municipais, capitalizar o voto subnacional e replicar os resultados nessas elei??es nacionais, a organiza??o do ex-presidente Rafael Correa, a principal for?a política do país, aposta na fideliza??o eleitoral e, nas entrelinhas, em uma preocupante sacraliza??o política.

Guillermo Lasso, presidente do Equador, discursa uma semana depois de dissolver a Assembléia Nacional e convocar elei??es antecipadas em maio - Karen Toso/Reuters Nessas elei??es, a Revolución Ciudadana lan?ou uma estratégia que busca, de acordo com seus porta-vozes, ressignificar a principal desqualifica??o atribuída a seus militantes por uma parte da opini?o pública e mudá-las em favor de sua campanha. Para isso, utilizam imagens criadas por inteligência artificial, que mostram pequenos cordeiros humanizados como se fossem crian?as. Aparentemente, a manobra consiste em apelar para as emo??es dos espectadores através da exibi??o de cordeirinhos em atividades tipicamente humanas, como estudar ou trabalhar. A lei eleitoral do Equador proíbe o uso de crian?as em campanhas eleitorais, justamente para evitar a apari??o delas em pe?as de campanha. O que essa manobra publicitária implica? Os porta-vozes do correísmo explicaram que, após serem rotulados de cordeiros, o uso dessa imagem como emblema de sua campanha é um ato de ressignifica??o, um processo criativo de apropria??o, uma reinven??o identitária. Entretanto, a manobra publicitária, ao que parece, oculta o reconhecimento da sacraliza??o da política como instrumento de a??o pública.Um dos historiadores mais importantes sobre a sacraliza??o da política no mundo é Emilio Gentile, professor emérito da Universidade Sapienza de Roma. Em "Political Religion: a Concept and its Critics – a Critical Survey", Gentile explica que a sacraliza??o da política é um processo que pertence à sociedade moderna, no qual a dimens?o política adquire um caráter religioso e se torna a m?e de novos sistemas de cren?as e mitos.A religi?o política é um fen?meno contemporaneo que representa o ápice da rebeli?o contra a religi?o do deus bíblico, que o humanismo iniciou e que tinha o objetivo de sacralizar o homem, mas que terminou na desumaniza??o do homem ao sacralizar o Estado, a na??o e a ra?a, afirma Gentile.